O antigo Clube de Leitura em Voz Alta deu lugar ao Coro de Leitura em Voz Alta. Tem normalmente um periodicidade quinzenal e acontece na Biblioteca de Alcochete.

Os objectivos continuam a ser os mesmos; promover o prazer da leitura partilhada; a forma passou a ser outra.

áfrica



a Cristina começou por ler-nos um pouco de "O prazer da leitura" de Marcel Proust


de seguida trabalhámos dicção

e as leituras do tema da sessão:

a Cristina e o Fernando leram um excerto de "A relíquia" de Eça de Queiroz


a Maria, a Alexandra e a Patrícia leram um excerto de "Os Lusíadas" de Luís de Camões


a Maria João leu um excerto de "Chuva Braba" de Manuel Lopes


a Ana Maria leu de João de Deus
Versão Zulu

Rainha Jacinta foi
dar uma tarde passeio,
quando mestre Ginga veio
assanhado como um boi;
e diz a Jacinta: – “Dói
ver que estás tão insensata;
em dia que a onda bata
assim com a força desta,
só sendo pessoa besta,
só sendo pessoa gata,
vem à praia fazer festa
sem medo de água que mata.”

Mas vai rainha Jacinta,
que tem bestunto e tineta,
cuida que Ginga diz peta,
cuida que Ginga lhe minta;
e diz ao Ginga: – “Consinta
ou não consinta o sinhora,
Jacinta vai praia fora,
buscando concha encarnada;
atrás de mim vem soldada,
vem gente que toda a hora
que me veja atrapaiada,
deita logo calça fora,
rainha Ginga é pescada.”

Mal sabia gente preta,
mal cuidava (triste dia!),
ver Jacinta numa pia
mais funda que uma gaveta!
Corre o gente todo inquieta,
rainha Ginga estrebucha;
foi obra dalguma bruxa
ir esticando a canela!
Gente preta pega nela,
preto larga, preto puxa;
mãe Jacinta volta a ela,
pai Ginga dança cachucha.

Jacinta é condecorada
com berliques de pendura
e faz bonita figura
com sua fita bordada,
com sua fita encarnada,
da cor que pretinho gosta;
fita maior que lagosta,
fita maior que pescada:
em n’a pondo atravessada,
rainha Ginga, bem posta,
pretinho bate palmada:
“- Viva Jacinta da costa!
Viva Jacinta pescada!”


o Luís leu excerto de "Carta a Guerra Junqueiro"
de Eça de Queirós, de Correspondência de Fradique Mendes
V. porém dirá (e de facto o diz): «Tornemos essa comunicação puramente espiritual, e que, despida de toda a exterioridade litúrgica, ela seja apenas como o espírito humano, falando ao espírito divino». Mas para isso é necessário que venha o Milénio — em que cada cavador de enxada seja um filósofo, um pensador. E quando esse Milénio detestável chegar, e cada tipóia de praça for governada por um Mallebranche, terá V. ainda de ajuntar a esta perfeita humanidade masculina, uma nova humanidade feminina, fisiologicamente diferente da que hoje embeleza a Terra. Porque enquanto houver uma mulher constituída física, intelectual e moralmente como a que Jeová, com uma tão grande inspiração de artista, fez da costela de Adão, — haverá sempre ao lado dela, para uso da sua fraqueza, um altar, uma imagem e um padre. 
Essa comunhão mística do Homem e de Deus, que V. quer, nunca poderá ser senão o privilégio duma élite espiritual, deploravelmente limitada. Para a vasta massa humana, em todos os tempos, pagã, budista, cristã, maometana, selvagem ou culta, a Religião terá sempre por fim, na sua essência, a súplica dos favores divinos e o afastamento da cólera divina; e, como instrumentação material para realizar estes objectos, o templo, o padre, o altar, os ofícios, a vestimenta, a imagem. Pergunte a qualquer mediano homem saído da turba, que não seja um filósofo, ou um moralista, ou um místico, o que é Religião. O inglês dirá: — «É ir ao serviço ao domingo, bem vestido, cantar hinos». O hindu dirá: — «É fazer poojah todos os dias e dar o tributo ao Mahadeo». O africano dirá: — «É oferecer ao Mulungu, a sua ração de farinha e óleo». O minhoto dirá: — «É ouvir missa, rezar as contas, jejuar a sexta-feira, comungar pela Páscoa». E todos terão razão, grandemente! Porque o seu objecto, como seres religiosos, está todo em comunicar com Deus, e esses são os meios de comunicação que os seus respectivos estados de civilização e as respectivas liturgias que deles sairam, lhes fornecem. Voilà! Para V., está claro, e para outros espíritos de eleição, a Religião é outra coisa — como já era outra coisa em Atenas para Sócrates e em Roma para Séneca. Mas as multidões humanas não são compostas de Sócrates e de Sénecas — bem felizmente para elas, e para os que as governam, incluindo V. que as pretende governar! 
De resto, não se desconsole, amigo! Mesmo entre os simples há modos de ser religiosos, inteiramente despidos de Liturgia e de exterioridades rituais. Um presenciei eu, deliciosamente puro e íntimo. Foi nas margens do Zambeze. Um chefe negro, por nome Lubenga, queria, nas vésperas de entrar em guerra com um chefe vizinho, comunicar com o seu Deus, com o seu Mulungu (que era, como sempre, um seu avô divinizado) . O recado ou pedido, porém, que desejava mandar à sua Divindade, não se podia transmitir através dos Feiticeiros e do seu cerimonial, tão graves e confidenciais matérias continha... Que faz Lubenga? Grita por um escravo: dá-lhe o recado, pausadamente, lentamente, ao ouvido: verifica bem que o escravo tudo compreendera, tudo retivera: e imediatamente arrebata um machado, decepa a cabeça do escravo, e brada tranquilamente — «parte»! A alma do escravo lá foi, como uma carta lacrada e selada, direita para o Céu, ao Mulungu. Mas daí a instantes o chefe, bate uma palmada aflita na testa, chama à pressa outro escravo, diz-lhe ao ouvido rápidas palavras, agarra o machado, separa-lhe a cabeça, e berra: — «Vai!» Esquecera-lhe algum detalhe no seu pedido ao Mulungu... O segundo escravo era um pós-escrito...
Esta maneira simples de comunicar com Deus deve regozijar o seu coração. Amigo do dito. — FRADIQUE


a Gabriela leu de Luísa Ducla Soares
Negra

Vós chamais-me moreninha
Mas eu morena não sou,
Sou tão negra como a noite
E a estrada por onde vou.

Tenho olhos de azeitona,
Minha pele é de pantera,
Meu corpo tem um traçado
Ágil e negro de fera.

Negra África me corre
Dentro das veias, num rio.
Só o meu sorriso é branco
Como as velas dum navio.

Não me chamem moreninha
Porque eu morena não sou,
Sou negra como o orgulho
De ser aquilo que sou.


o Renato leu um excerto de "O coração das trevas" de Joseph Conrad


a Virgínia e a Celina leram "A serpente de Olumo",
conto da tradição oral da Nigéria, de "Contos Nigerianos"


a Ilda também leu um excerto de "O coração das trevas" de Joseph Conrad


a Margarida leu um excerto de "Os Lusíadas", Canto V de Luís de Camões


a Teresa leu de Henrique Teixeira de Sousa
Entre gente de sobrado, de loja e de funco, nasci e vivi.
Nunca cheguei a perceber bem qual o lugar me coube nessa sociedade.
Por isso, este livro é de todos e para todos.

A igreja estava apinhada de gente. Não de gente que viesse toda ao funeral de Nha Caela. Gente, sim, que estava ali, na maioria, para assistir à missa grande do dia de S. Lourenço. Desde o altar-mor até cá fora à entrada quase não havia lugar para cair uma agulha, tantos eram os pés e os joelhos que cobriam o chão. No meio da igreja, numa rodinha que pouco mais era que o espaço para meia dúzia de covas de milho, descansava o caixão de Nha Caela. Quatro castiçais de bronze ladeavam o esquife. As velas de cera ardiam serenamente, dir-se-ia a alma bondosa da finada evolando-se da terra. Bafo morno pairava no ambiente de mistura com o cheiro a podridão que vinha do corpo da defunta. Mas isso não impedia que mais pessoas procurassem furar a multidão para se instalarem pertinho dos castiçais. Nem mesmo se sabia quando findavam os apertões e de que maneira o padre Afonso havia de realizar as exéquias. Logo foi ela morrer na véspera de S. Lourenço e escolher precisamente aquela igreja para receber o ofício fúnebre, no dia 10 de Agosto, dia do orago da freguesia. Bem podia ser enterrada na cidade, onde de resto residia a maior parte do ano. Mas morreu no sobradão de Ilhéu de Contenda, e assim deixara recomendado ao filho Eusébio, caso fechasse os olhos na sua casa de campo, que a sepultassem no cemitério de S. Lourenço, ao lado do amado esposo. Muito nutrida e pesada, não foi sem alguma dificuldade que transportaram o corpo até à igreja, debaixo de um sol de rachar. O camião, que devia vir de S. Filipe para acarretar o caixão, teve dois furos e ficou parado por altura de Cutelo Comprido. Quando o ajudante do camião chegou suado ao sobradão para informar Nhô Eusébio da avaria, este já havia recrutado oito homens para levar o esquife, que agora estava a ser desrespeitado pelos festeiros, e donde exalavam os odores fétidos que empestavam a igreja. Até pingava líquido pútrido por baixo, saído talvez dos orifícios naturais. Não era para admirar, com o calor que fazia. Calor prenunciando mais chuva. Desde 20 de Julho que chovia a bom chover. Nunca se vira ano agrícola que começasse com tanta chuva. Quase todos os dias caía água do céu. Por isso, andava tudo verde, do mar até à serra. Forçosamente que seria um ano farto.

excerto de "Ilhéu da Contenda"


o Tomás leu o prólogo de "A cabana do pai Tomás" de Harriet Beecher Stowe

Este relato refere-se a uma raça de homens nascidos sob o sol dos trópicos, uma raça resignada, heróica e abnegada ao longo de muitos anos – a raça de cor, a raça negra -, embora já se vislumbre, clareando na distância de um belo horizonte, o amanhecer de melhores dias. Foi a influência díspares, tendendo a converter em maravilhosa realidade a máxima do Cristianismo: «Amai-vos uns aos outros.»                                   
Surge na mente da autora deste livro a recordação da África, o malfadado continente que constituiu o primeiro degrau da grandiosa escadaria que conduzia à civilização ao progresso nos primeiros alvores de uma humanidade que ainda permanecia adormecida na noite dos tempos – essa África que, após muito século de horrível escravidão, lança agora no espaço, se bem que ainda em vão, o seu angustioso apelo de liberdade. Talvez por isso, a raça dominante tenha entendido finalmente que nunca é tarde para se abrir à compreensão e à convivência cordial, começando a franquear o coração à piedade, serenamente convencida que é muito mais nobre proteger a pária a escravizá-lo extenuá-lo com o rigor da mais infame das desditas humanas. Graças, pois, ao céu, por haver permitido que o mundo pudesse sobreviver à traficância dos negros!



a Luísa e a Ana leram um conto tradicional do Burkina Faso "O belo negro"


a Gabriela apresentou "Capitãs de Abril" de Ana Sofia Fonseca como livro do dia


e para terminar... entre outras iguarias tivemos Fogaças de Palmela
 Fogaças de Palmela

500 g de pão em massa; 500 g de açúcar amarelo; 1 kg de farinha; 125 g de banha; 2 ovos + 1 ovo para pintar; sumo de 2 laranjas; raspa de 1 laranja; aguardente; canela; erva-doce

Ligam-se os ovos ao pão em massa. Juntam-se em seguida, o sumo e raspa das laranjas, a banha, o açúcar, a canela, a erva-doce, a aguardente e por fim a farinha. Depois de tudo bem ligado e amassado deixa-se levedar durante 30 minutos. Moldam-se várias formas, como animais, corações, pés, mãos, cachos de uva,..., e pintam-se com ovo batido. Vai a cozer em tabuleiro untado em forno moderado.

Nota: Poderá levar um pouco mais de farinha, dependendo do tamanho dos ovos e das laranjas para que a massa tenha uma consistência que a permita moldar. A erva-doce e a canela são a gosto, no entanto a quantidade de erva-doce deverá ser sempre superior à da canela. Pode não levar raspa de laranja, mas sim de limão.

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