O antigo Clube de Leitura em Voz Alta deu lugar ao Coro de Leitura em Voz Alta. Tem normalmente um periodicidade quinzenal e acontece na Biblioteca de Alcochete.

Os objectivos continuam a ser os mesmos; promover o prazer da leitura partilhada; a forma passou a ser outra.

2 de Novembro de 2010 - Miguel Torga

A leitura do António foi uma magnífica introdução:


MIGUEL TORGA

Miguel Torga é o pseudónimo de Adolfo Correia Rocha, nascido em São Martinho da Anta, concelho de Sabrosa, distrito de Vila Real, província de Trás-os-Montes e Alto Douro em 12 de Agosto de 1907 e falecido em Coimbra a 17 de Janeiro de 1995. Durante esse intervalo de tempo foi seminarista em Lamego, tendo desistido ao fim de dois anos e emigrado para o Brasil em 1920, onde um tio era fazendeiro de café. Em 1925 regressa a Portugal, pois o tio resolvera pagar-lhes os estudos. Acabou o liceu em dois anos e em 1928 entra para a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra onde se formou em 1933, mas só em 1939 é que viria a exercer a profissão. O pseudónimo nasce em 1934. A sua obra desdobra-se entre poesia, contos, diário e teatro e está traduzida para mais de uma dezenas de línguas, tendo recebido vários prémios nacionais e estrangeiros.

Mas afinal o que diz Miguel Torga?

Do 1º volume do DIÁRIO:
Coimbra, 8 de Agosto de 1941 – Morreu ontem Rabindranath Tagore. Nos jornais, entre peças de artilharia e aviões, a sua máscara cheia de humanidade e santidade veio acicatar em mim este danado problema da salvação. Não da salvação em Deus ou em qualquer paraíso. Da salvação neste mundo, de terra, com homens e com paixões. Veio agudamente dizer-me que ou uma ou outra. Ou se escolhe como ideal um S. Francisco de Assis a rasgar-se nas silvas e a tratar de tordos, ou não há outro remédio senão a gente integrar-se no movimento universal desta gigantesca máquina moderna, e fazer nela de parafuso, como mostrou Chaplin. Assim divididos com luz e sombra na alma, vestidos e despidos, ao mesmo tempo como frutos mal descascados, é que não. Assim é morrer todos os dias.

Sobre Miguel Torga, falta dizer dizer que evitava o contacto com as elites pedantes coimbrãs, que o consideravam como tendo péssimo feitio e como o rei dos chatos.
E , entretanto, o que fazia o Adolfo Correia Rocha? Instalado no seu consultório médico no centro de Coimbra, dava consultas grátis aos pobres. Os seus clientes consideravam-no de trato afável e bom conversador.

A Helena tinha preparado os versos de entrada do "Cântico do Homem", mas infelizmente não se pôde juntar a nós nesta sessão.


A Mila trouxe-nos dos Bichos a história de Bambo, o sapo. Podem lê-la aqui.

Já repararam na abóbora? Pois foi... depois do "Tio Arruda" (arruda é nome de erva mágica) e do Bambo (os sapos são muito usados em bruxaria) a Helena R. leu o Bruxedo dos Contos da Montanha









A Mariana trouxe-nos A Ceia

A Cecília leu um excerto de um dos prefácios: "Na tua ideia, o que escrevo é para te regalar e, se possível, te comover. Mas quero que saibas que ousei partir desse regalo e dessa comoção para te responsabilizar na salvação da casa que, por arder, te deslumbra os sentidos". Já agora, mais uma sugestão para "ler de maneira diferente..."













O Daniel leu Perfil

Não. Não tenho limites.
Quero de tudo
Tudo.
O ramo que sacudo
Fica varejado.
Já nascido em pecado,
Todos os meus pecados são mortais.
Todos tão naturais
À minha condição.
Que, quando por excepção,
Os não pratico
É que me mortifico.
Alma perdida
Antes de se perder,
Sou uma fonte incontida
De viver,
E o que redime a vida
É ela não caber
Em nenhuma medida.
Coimbra, 2 de Março de 1979
in Poesia Completa -Publicações Dom Quixote

A Paula leu o prefácio da Criação do Mundo e um excerto do mesmo livro













A Isabel leu Súplica:
Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

E o João foi aos Novos Contos da Montanha buscar Fronteira.













Do livro Libertação o Augusto trouxe Meditação:

Monte
Uma palavra, sol e a sensação
De que é um largo horizonte
O fosso que nos mede o coração.

Cobrem-se de balidos e ternura
Os tojos onde o corpo se rasgou;
Uma brisa de paz e de frescura
Ondula o que há-de vir e que passou.

Mas um moinho ao longe mói a vida...
Sem se deter, o malmequer da vela
Desfolha sobre a alma ressequida
A poeira do sonho que esfarela.

... e ainda Os ciganos

Tudo o que voa é ave.
Desta janela aberta
A pena que se eleva é mais suave
E a folha que plana é mais liberta.
Nos seus braços azuis o céu aquece
Todo o alado movimento.
É no chão que arrefece
O que não pode andar no firmamento.
Outro levante, pois, ciganos!
Outra tenda sem pátria mais além!
Desumanos
São os sonhos, também...

A Ana Rita leu Lei também do mesmo livro!
Nascer e ficar aqui
Onde os pés sentem firmeza.
Subir ao céu em beleza,
Mas em sonhos, em mentira,
Não vá deixar-nos a lira
De mal com a natureza.

Ser homem como outros homens
Na terra onde se alimenta
O sangue que nos sustenta
A pele e o coração.
Lutar por todo aquele pão
Que corre da placenta.

Dar a alma a um deus dos nossos,
Por uma religião
Com bases na condição
E na dureza dos ossos.
E não rezar padre-nossos
Qualquer que seja a razão.

Trabalhar quanto é preciso
Com alegria e justiça.
Ter um pouco de preguiça
Quando o sol se descobrir.
E dar o sexo à mulher
Que mais fundo nos pedir
E mais fundo nos souber.


E a Teresa leu o prefácio à 2ª edição dos Novos Contos da Montanha e terminou, como começaram a Cristina e o Fernando, com Sísifo:

Recomeça....
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças...

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