O antigo Clube de Leitura em Voz Alta deu lugar ao Coro de Leitura em Voz Alta. Tem normalmente um periodicidade quinzenal e acontece na Biblioteca de Alcochete.

Os objectivos continuam a ser os mesmos; promover o prazer da leitura partilhada; a forma passou a ser outra.

2012.01.24 - Meditação

Alexandra Ferreira
"Debaixo da roupa, estamos todos nus"
de José Luís Peixoto
do livro "Abraço"

muito bem acompanhada pelo Nuno





Teresa
Não desfazendo
de Manuel António Pina de "O Pássaro da Cabeça"

Delfina
O Pássaro
de autor desconhecido
O pássaro…

Era uma vez um pássaro que vivia numa floresta de encantar num país do norte da Europa. Nessa floresta, ele realizava voos radicais que preenchiam os seus dias, mas o Outono chegou devagarinho, a roda das estações girava e o Inverno aproximava-se a grande velocidade. O pássaro sentiu a urgência de partir quando chegaram as primeira neves e com elas os grandes frios. Levantou voo e começou a voar para um local mais quente.

Algum tempo depois, o frio era tanto, mas tanto, que as asas começaram a gelar, até que o impediram de voar e ele caiu numa quinta inanimado e enregelado. No preciso local onde o passarinho estava caído lutando contra a morte, passou uma vaca que largou uma valente bosta em cima dele. Como a bosta estava quente ajudou o gelo das asas a derreter e a aquecer o passarinho que começou a piar feliz, mas o sossego e alegria foram de pouca dura para a pequena ave. Um gato que vivia na quinta e andava esfomeado, ouviu-o debaixo da bosta e com uma velocidade incrível agarrou-o e comeu-o.

  
Deste conto podem ser retiradas três morais: 

1ª Nem sempre quem te caga em cima é teu inimigo.

2ª Nem sempre quem te tira da merda é teu amigo.

3ª Mesmo que estejas atolado em merda não pies.

Rosa
Prece gratidão de Amélia Rodrigues

Vasco, Vitória e João.
Imposto sobre meditação no CLEVA
pelos próprios
João- Raramente aceitamos meditar a partir dos que foram estigmatizados como pecadores notórios, à semelhança dos cobradores de impostos e das prostitutas do tempo de Jesus. No entanto, são exatamente eles, que têm material mais abundante e profundo para quem não duvida que meditar faz bem.
(Pausa para reflexão)
Vitória- Por ordem do Exmo. Sr. Ministro das Finanças Vítor Gaspar, vai o João proceder á cobrança do IMC (Imposto Extraordinário Sobre Meditação no CLEVA).
(João percorre o grupo para proceder à coleta.)
Vasco- Meditando sobre as novas taxas do IVA: O jantar na tasca foi mais caro esta noite. Paguei o jantar mais caro do que o bilhete para o teatro.
Vitória- Já eu, só bebi e não comi para não sentir o efeito do IVA. Como o vinho não aumentou, esqueço a austeridade e bebo ao preço de antigamente.
João – Então jantaste sozinho?
Vasco- Sim, alguém quer jantar com cobradores de impostos?
Vitória- Jesus jantou! E Ele ensinava-os. Naquele tempo, muitos cobradores de impostos e pecadores também se puseram à mesma mesa com Jesus e os seus discípulos, pois eram muitos os que o seguiam.
Mas os doutores da Lei do partido dos fariseus, vendo-o comer com pecadores e cobradores de impostos, disseram aos discípulos: «Porque é que Ele come com cobradores de impostos e pecadores?»
Jesus ouviu isto e respondeu: «Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os enfermos. Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.»
Vasco – E a dizima cobrada na missa? Mantém a taxa do IVA?
João– Sim mantém a mesma taxa. Em negociações com a igreja, mantivemos a taxa por troca com o Corpo de Deus e o 15 de Agosto.
Vitória- Penhorámos o Corpo de Deus?
Vasco – Sim, só não sabemos se o colocamos à venda através de leilão electrónico ou nos classificados do Correio da Manhã.
João - E quem é que o vai comprar? Será que os chineses da EDP estão interessados?
Vasco – Seria outra aquisição iluminada.
Vitória - Nem me fales nisso! A taxa da energia também sofreu um aumento brutal.
Vasco - Pelo menos os livros mantiveram a taxa.
João - Só podes é lê-los à luz do dia, porque à noite ficam caros.
Vitória - Mais vale irmos ao teatro, que pelo menos não aumentou tanto.
João- Em que ficamos, afinal sobre a meditação fiscal?
Vasco - Já desisti de ir ao restaurante e de ler à noite. Agora leio um livro de dia com uma garrafa de vinho ao pé de mim.
Vitória- Por falar nisso, onde é que pagamos a fatura da eletricidade? No Continente ou nas lojas do chinês?
João – No Continente tens desconto de 10%, na loja do chinês habilitas-te a uma viagem em charter. Mas as taxas são as mesmas no Continente, nas ilhas e na China?
Vasco- Observando a verba 2.12 da lista I do Código do IVA, conjugado com a alínea c) do nº1 do artigo 18º do mesmo diploma, cumprindo com o novo Orçamento de Estado, aplica-se a taxa de 23%, até para os chineses!
Vitória - Mesmo para o Alberto João?
João - Claro, não vamos ser nós a suportar a energia da ilha do Jardim.
Vasco - Nem a troika deixava que fosse de outra maneira!
Vitória - E o IMC (Imposto Extraordinário Sobre Meditação no CLEVA) também é imposição da troika?
João - Seja ou não, têm de pagar, afinal é um imposto.
Vasco - E cobrar impostos é, ou não é, uma atividade nobre?
Vitória- A própria bíblia o recomenda. Jesus aconselha-nos a pagar impostos. Quando lhe perguntaram:
“Dize-nos, pois, que te parece? É lícito pagar tributo a César, ou não?
E Jesus respondeu que os cristãos devem pagar os seus impostos de boa vontade, tendo dito: "Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus. Pelo que é necessário que lhe estejais sujeitos, não somente por causa da ira, mas também por causa da consciência."
Vasco – Esta citação bíblica vem mesmo a propósito das taxas moderadoras cobradas no Centro de Saúde. A ira pelo tempo de espera, a consciência de que podemos estar doentes e depois de paga a taxa, chegou a nossa vez e avisam que o medico está de baixa.
João- Ainda a eletricidade era a 6%, um livro que li, dizia:
Para meditar, segundo a proposta do livro, é necessário despojar-se da arrogância de ser justo e perfeito, e aceitar que os cobradores de impostos e as prostitutas se tornem nossos mestres para a meditação e a oração.

Alexandra Justino
O contador de histórias - Tradição oral judaica
de A árvore dos tesouros




Helena Machado
A cidade dos poços
Contos para pensar de Jorge Bucay


Aqui numa versão animada:




António Gil
Excerto de "Meditação – A luz dentro de nós"
de J. Krishnamurti

Podemos perguntar o que é meditação - não “como” meditar. Quando perguntamos esperamos que haja alguém para nos dizer o que fazer. Se não perguntamos “como” e perguntamos o que é meditação, então temos de pôr em acção a nossa própria capacidade, a nossa própria experiência, por muito limitada que seja; temos de pensar. Meditar é ponderar, reflectir, dedicar-se, não a alguma coisa, mas ter espirito de dedicação. Espero que estejais a escutar, para descobrirdes por vós mesmos, porque ninguém, ninguém pode ensinar-vos o que é meditação, por muito comprida que seja a barba dessa pessoa ou por mais estranho que seja o vestuário que ela use. Descobri por vós mesmos e ficai com o que descobrirdes por vós, não fiqueis dependentes de ninguém.
É preciso compreender muito cuidadosamente o significado da palavra meditação, cuja raiz é “medir”. E o que é que isso implica? Desde os antigos gregos até aos tempos modernos, todo o mundo tecnológico está baseado no medir. Não é possível construir uma ponte, ou um espantoso edifício de cem andares sem essa operação que é medir. Interiormente também estamos sempre a medir: “Eu fui, eu serei”; “Eu sou isto; eu fui isto, eu tenho de ser aquilo” - o que não é apenas medida, mas também comparação. Medir é comparar: “tu és alto, eu sou baixo; eu sou branco e tu és preto”. Compreendei o sentido da comparação e das palavras melhor e mais, e não as useis interiormente, psicologicamente. Estais a fazer isso agora, enquanto estamos a conversar?
Quando o cérebro está liberto da comparação psicológica, as próprias células do cérebro que têm sido usadas para comparar, que foram condicionadas por essa comparação, despertam subitamente para a verdade de que, psicologicamente, a comparação é destrutiva. Portanto, as próprias células do cérebro sofrem uma mutação. O vosso cérebro tem estado habituado a ir numa certa direcção, e pensais que esse é o único caminho para o que quer que esteja no fim desse caminho. O que está no fim desse caminho é, naturalmente, aquilo que inventais. E quando chega um homem que vos diz que essa direcção não vos levará a lado nenhum, resistis, dizendo: “Não, Você está enganado, todas as tradições, dizem que Você não tem razão”. O que significa que não investigastes realmente - estais a citar outras pessoas, o que quer dizer que estais a resistir. Assim o homem diz: “Não resistais, escutai o que estou a dizer; escutai aquilo que estais a pensar, qual é a vossa reacção e também o que estou a dizer”. Portanto, escutai tudo isso. E para assim se escutar, precisais de prestar atenção, o que significa que há espaço na vossa mente.
Assim, descubramos se podemos viver - não em momentos de uma determinada “meditação”, mas viver a vida diária - sem comparar psicologicamente. Viver uma vida sem esse sentido de medir, de comparar, é meditação. Meditação implica um sentido de profunda compreensão dessa mesma palavra; e a própria compreensão, a percepção profunda dessa palavra é a acção que fará acabar a medida, o “mais”, o “menos”, etc., a comparação psicológica.



Helena P. e António Soares
O guardador de rebanhos
de Alberto Caeiro.
Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que ideia tenho eu das coisas?
Que opinião tenho eu sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das coisas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar em muitas coisas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

“Constituição intima das coisas”…
“Sentido intimo do Universo”…
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em coisas dessas.
É como pensar em razões e fins.
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das
árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das coisas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

O único sentido íntimo das coisas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.

Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as coisas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e o sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar,
Porque, se ele se fez, para eu over,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de sí próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.

Paulo Machado
Siddharta (excerto)
de Hermann Hesse




Ana França e Ana Valente
O pequeno caranguejo
autor desconhecido


O Pequeno Caranguejo

Numa praia protegida por rochas, vivia uma colónia de caranguejos.
Estes eram bastante pequenos, atingindo na idade adulta, não mais do que 3 centímetros.
Todos os anos, durante os meses de verão, os caranguejos perdiam a sua carapaça, expondo-se aos predadores e sendo presas fáceis para outros bichos do mar, da terra e do ar. Nesta fase do seu crescimento protegiam-se dos perigos da vida permanecendo em buracos nas rochas. Não se alimentavam enquanto aguardavam o crescimento de uma nova carapaça.
Um deles, ainda jovem, perguntava aos mais velhos por que motivo não iam para lá das rochas.
Porque não se aventuravam no mar... Os mais velhos contavam-lhe histórias aterradoras de gaivotas esfomeadas, de polvos devoradores, de pescadores furtivos. Não era seguro ir para lá das rochas. Toda a vida tinham feito o mesmo: escondiam-se enquanto a carapaça não crescia. Era assim que se fazia, era assim que podiam crescer.
O pequeno caranguejo perguntava-se por que motivo não cresciam mais uma vez que todos os anos mudavam de carapaça. Se mudavam de carapaça para crescer, porque não cresciam?
Um dia decidiu partir à aventura. Indo contra todos os conselhos e advertências dos mais velhos, e sem a protecção da sua carapaça, optou por avançar para lá das rochas protectoras.
E ainda que sentisse medo e alguma ansiedade, o seu desejo de descobrir mais do mundo à sua volta empurrou-o para lá das rochas. Enquanto seguia o seu caminho, podia ouvir os outros caranguejos a chamar por ele. A gritar-lhe, a dizer que não sobreviveria. Pediam-lhe que voltasse para trás. Chamavam-lhe louco.
Mas o pequeno caranguejo não deu ouvidos. A verdade é que, mesmo na segurança da praia ele assistira a familiares seus serem devorados por gaivotas. E... preferia morrer enquanto se aventurava por novas paisagens.
A princípio foi-lhe difícil atravessar a barreira protectora e o pequeno caranguejo lutava contra as ondas. Apesar de parecer que não saía do mesmo lugar, aos poucos avançava uns centímetros.
Enquanto lutava contra a força das ondas, o seu corpo mole foi-se tornando mais maleável e elástico. Se se aperceber, de cada vez que lutava para vencer uma onda o seu corpo parecia crescer mais um pouco. E de cada vez que uma onda o atirava contra uma rocha, ficava com a sensação de que o seu corpo mole se tornava mais rijo.
Demorou alguns dias até conseguir avançar para lá da protecção das rochas.
Quando finalmente ultrapassou a barreira, ficou de boca aberta! O mar era vasto e cheio de cores! Muitos peixes, de muitos tamanhos e cores variadas! Plantas que nunca sonhara poderem existir! E tudo parecia estar ali para lhe dar as boas vindas!
Foi então que deu de caras com um ENORME CARANGUEJO, com mais de meio metro de envergadura! Um caranguejo com uma carapaça rija e de cores vivas como nunca imaginara!
Falou com o caranguejo GIGANTE. Perguntou-lhe como era possível ser tão GRANDE.
O caranguejo gigante respondeu-lhe:
"Sabes, todos os caranguejos na tua colónia poderiam ser grandes como eu. Mas para ser assim grande, é preciso vencer a força das ondas e ter a coragem de poder ser apanhado por uma gaivota. É preciso ter a força de vontade para não desistir e lutar contra os perigos da Natureza. Mas a verdade é que a maioria dos perigos são inventados. Podemos morrer a tentar crescer, ou podemos morrer na pequenez que conhecemos desde o dia em que nascemos.
É sempre uma questão de escolha."


Mila
O chão que ela pisa (excerto)
de Salman Rushdie



Carmen
5 princípios do Reiki

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