A
leitura em voz alta, quando bem feita, é uma das melhores
ferramentas da promoção da leitura. O PNL2027 e a Andante acreditam
no poder da leitura e do livro, nos benefícios de ler em voz alta,
de ler em comunidade.
Reconhecendo
o valor deste trabalho, o PNL2027 convidou a Andante a partilhar a
sua experiência com o Clube de Leitura em Voz Alta, de modo a que o
modelo possa ser replicado e adaptado a cada caso.
Cristina
Paiva, a actriz da Andante Associação Artística, explica-lhe tudo
em cinco vídeos:
Um
Clube de Leitura em Voz Alta é um grupo de pessoas que se reúne
regularmente para partilhar leituras em voz alta.
Qual
é a diferença, então, de um outro Clube de Leitura? Neste, as
pessoas mais do que discutirem um livro, um autor ou um tema,
exercitam a sua capacidade de ler para os outros e de os seduzir para
as suas leituras preferidas.
As
competências leitoras desenvolvidas num grupo assim, tornam estes
leitores melhores mediadores de leitura, melhores sedutores para os
livros.
É
fundamental que alguém conduza as sessões e que a duração de cada
uma não exceda as duas horas (90 minutos é o ideal).
É
importante também definir à partida a duração do Clube: seis
meses, um ano, um período lectivo. E que quem quiser participar,
entre no início e não a meio do trabalho.
O
número ideal de participantes deverá andar entre os 15 e os 30.
Quando
se abrem inscrições deve aceitar-se um número de pessoas superior
àquele que se deseja (para suportar as quebras) e deve ser-se muito
claro quanto à duração e objectivos.
A
periodicidade depende de cada grupo. Quinzenal, parece estabelecer
uma boa regularidade sem se impor demais na vida das pessoas, mas
numa escola, fazê-lo uma vez por semana, talvez não seja demais. Há
grupos que preferem fazê-lo mensalmente.
Um
grupo de leitores (e de mediadores de leitura) deve ser tudo menos um
espaço snob, exclusivo, soturno ou exibicionista de saberes. Todos
se devem sentir parte desse colectivo e crescer com ele. Quem dirige
o Clube deve ter muita atenção a todos e a cada um, para que todos
tenham o seu tempo mas que ninguém o monopolize. Um ambiente
descontraído, em que todos colaboram, é um meio mais fácil para
conhecer novos textos, novos autores e novos modos de olhar o mundo.
Poderá
realizar-se em qualquer lugar desde que haja uma sala com uma cadeira
para cada pessoa: uma biblioteca, uma escola, uma sociedade cultural,
etc.
Porquê
um Clube de Leitura em Voz Alta? Veja o próximo vídeo.
Tutorial 2 - Porquê um Clube de Leitura em Voz Alta?
Porque
podemos partilhar com os outros as nossas leituras preferidas numa
situação protegida;
porque
se praticam técnicas que tornam mais eficaz a nossa leitura em voz
alta;
porque
desenvolvemos a nossa capacidade crítica relativamente aos textos;
porque
emprestamos à linguagem escrita, o nosso corpo, a nossa voz e a
nossa emoção e com isso acrescentamos interesse à leitura;
porque
seduzimos novos leitores pelo convívio, pelo desenvolvimento de
competências para falar em público, pela descoberta de novos textos
e autores.
Ou
seja, porquê um Clube de leitura em voz alta? Porque aumentamos o
número de bons leitores de uma comunidade.
“Já
não há o direito de colocar as palavras na boca antes de as meter
na cabeça? Já não há ouvidos? Já não há música? Já não há
saliva? As palavras já não sabem a nada? O que é que se passa? Não
declamou Flaubert a sua Bovary em altos gritos, até furar os
tímpanos? Não estará ele definitivamente melhor colocado do que
qualquer outro para saber que a compreensão do texto passa pelo som
das palavras, de onde deriva todo o seu sentido? Não saberia ele
como ninguém, ele que tanto lutou contra a música intempestiva das
sílabas, contra a tirania das cadências, que o sentido se
pronuncia? Então? Textos mudos para puros espíritos? Rabelais,
ajuda-me! Flaubert, Dosto, Kafka, Dickens, acudam-me! Gigantescos
anunciadores de sentido, venham cá! Venham soprar nos nossos livros!
As palavras precisam de corpo! Os nossos livros precisam de ter vida!
“
Daniel
Pennac
Quer
saber como funciona um Clube de Leitura em Voz Alta? Veja
o próximo vídeo.
Tutorial 3 - Como funciona um Clube de Leitura em Voz Alta?
As
leituras de cada sessão são subordinadas a um único tema. Todos os
participantes lêem o texto que escolheram sobre esse tema, seja ele
poesia, prosa ou ensaio.
Na
primeira sessão do Clube os participantes escolhem um tema que
escrevem num papel. Os papéis são guardados numa caixa e no final
de cada sessão é sorteado um que será o tema de leitura da
próxima.
Sobre
esse tema, cada pessoa ou grupo de pessoas escolhe um texto curto e
prepara-o para ler em voz alta, para todo o grupo, na sessão
seguinte.
Cada
um escolhe um tema que gostasse de ver tratado pela literatura. Quem
lidera as sessões pode pedir que os participantes sejam criativos
nos temas que escolhem para não se cair nos lugares comuns
“primavera”, “sonho”, “amor”, etc.
Quando
é sorteado o tema, quem dirige os trabalhos pode acrescentar
interesse à escolha dos textos acrescentando um “obstáculo”,
por exemplo: que os textos sejam só de autores do século XXI, ou só
trazer crónicas, ou ainda que tem de ser lido em grupo. A
criatividade na introdução de novos desafios faz com que o
interesse do clube se mantenha.
Como
antes da 1ª sessão ainda não há temas para sortear, esta deverá
ser preparada pelo dinamizador com textos curtos previamente
escolhidos e um modo de abordar a leitura simples e sedutor. Deverá
também expor todas as questões relacionadas com o funcionamento:
datas, horas, locais e meios de se comunicarem entre si.
Parece-nos
fundamental reforçar a ideia de que o clube não serve para ler
livros de auto ajuda, receitas culinárias, etc. mas sim literatura:
romance, conto, crónica, poesia, ensaio. Parece-nos mais saudável
para a vida do Clube impedir que as pessoas leiam textos próprios,
não só porque pode criar alguns embaraços mas essencialmente
porque quem lê o seu próprio texto está preocupado com tudo menos
com as técnicas de ler bem, está mais preocupado se o seu texto é
bem aceite e se torna num sucesso. Gerir egos não é fácil mas é
essencial num grupo deste tipo.
MUITO
IMPORTANTE: cada leitura não deve exceder os três minutos.
Se
for preciso, adopta-se um cronómetro com sinal sonoro para os mais
distraídos. A razão deste tempo aparentemente tão curto, é a de
que as pessoas que leem em voz alta, em geral, têm tendência para
gostar de se ouvir e como não se preparam tão convenientemente como
um profissional, podem tornar num tédio o que se queria um prazer
(para além de monopolizarem o tempo do grupo). Isto deve ser bem
frisado na primeira sessão e reforçado sempre que necessário.
Para
além disto o que há mais?
Há
que trabalhar a exposição em público e vencer as barreiras
existentes; mostrar de que livros e autores se gosta; ganhar
consciência das capacidades próprias de expressão, corporais e
vocais.
Quem
conduz o grupo deverá em cada sessão fazer alguns exercícios: uns
para reforçar a dinâmica do grupo e os laços entre todos e outros
para trabalhar algumas técnicas de corpo, respiração, voz e
expressão.
Eis
alguns exemplos das técnicas que já usámos:
Integração
Fazer
com que as pessoas aprendam os nomes uns dos outros:
-
conversando em pares e posteriormente apresentando-se mutuamente;
-
atirando uma bola a outro e dizendo o seu nome e depois o inverso,
atirando a bola dizendo o nome do visado.
Respiração
-
conseguir que o grupo respire junto no mesmo ritmo conduzindo o tempo
de inspiração e expiração;
-
ganhar consciência dos mecanismos da respiração para a poder
controlar através de exercícios de respiração abdominal, torácica
e mista;
-
exercícios de impulsos diafragmáticos para ir trabalhando a
projecção do som ( soprando com força) usando consoantes como
“pssst” , “fffshhhhh” ou “qssssst”.
Articulação
Dizer
trava línguas individualmente e em grupo. Ir acelerando para tornar
mais difícil, interessante e engraçado o jogo.
Ex:
O
peito do pé de Pedro é preto.
Quem
disser que o peito do pé de Pedro é preto
tem
o peito do pé mais preto
do
que o peito do pé de Pedro.
Separar
as palavras por sílabas e repeti-las algumas vezes até que não se
voltem a cometer os mesmos erros de “comer” letras e se digam as
palavras inteiras.
Expressão
Ganhar
consciência da imagem que o corpo produz através de exercícios
feitos em conjunto, a pares ou em grupos maiores: o jogo do espelho
(a par, reproduzir os movimentos e expressões do parceiro) ou da
estátua (montar uma escultura com o corpo dos outros), por exemplo.
Interpretação
dos textos
Usar
personagens tipo para interpretar os textos que escolhemos (uma
criança, um vendedor, uma professora, uma velha, etc.);
usar
contextos inusitados para inserir o texto criando assim mais camadas
de leitura para quem ouve (um comício, um segredo, uma conversa de
café, etc.).
Quer
saber como se mantém o grupo? Veja o próximo vídeo.
Tutorial 4 – Como se mantém o grupo? Como evolui?
Ao
fim de poucas sessões o Clube deixa de ser apenas um grupo de
leitores para passar a ser um grupo de amigos leitores.
Preocupamo-nos uns com os outros, organizamos actividades fora da
biblioteca e dos horários normais, emprestamos livros uns aos
outros, damos a conhecer autores que prezamos e fazemos apresentações
públicas das nossas leituras.
As
apresentações públicas são feitas normalmente no final do período
definido para o Clube e são fundamentais. É quando o grupo se abre
à comunidade, é quando novos membros se inscrevem, é quando a
sedução é maior.
É
importante acordar com o grupo o modo, o lugar, a data e público
alvo destas apresentações.
E
também... bolos. Sim, a festa é muito importante. Comer, beber,
dançar, plantar árvores, ir a palestras e espectáculos, conhecer e
dar a conhecer novos projectos de promoção da leitura. Fazemos
disso um hábito tão bom como ler.
O
Clube de leitura em Voz Alta é um espaço de liberdade, um lugar
onde se podem criar laços e um escape ao stress do dia a dia.
O
Clube de Leitura em Voz Alta pode ver-se de fora? Veja o próximo
vídeo.
Tutorial
5 – O Clube de Leitura em Voz Alta pode ver-se de fora?
O
Clube de Leitura em Voz alta pode e deve ver-se de fora.
É
aconselhável fazer uma cobertura das sessões com fotos, vídeos e
textos.
É
importante deixar registado o que se fez, o que se leu em cada um dos
temas, para que cada sessão não se esgote em si própria.
Hoje
em dia há imensos canais e formatos onde esta informação poderá
ser disponibilizada quer para todo o público, quer apenas para um
grupo restrito.
E
naturalmente as apresentações abertas à comunidade são a face
mais visível do Clube.
Conselhos
práticos para um bom Clube de Leitura em Voz Alta
-
escolham textos curtos (máx. 3 minutos)
-
vão à literatura (poesia e prosa) e deixem de fora a auto-ajuda e
os “livrinhos de capa cor-de-rosa”
- as
leituras terão de ser feitas a partir dos livros e não de textos
retirados da internet
-
cada um deve trabalhar bem a sua leitura antes de a apresentar ao
grupo, de forma a causar maior impacto
-
tentem sempre surpreender, quer através dos textos escolhidos, quer
através da forma como os apresentam aos outros
-
não permitam leituras de textos escritos pelo próprio. Trata-se de
um Clube de Leitura e não de um Clube de escrita. A ideia é que as
pessoas procurem textos sobre um tema e não que escrevam textos
sobre o tema.
Com
o grupo já consolidado podem inserir-se outras actividades que não
terão de obedecer ao tema de leituras da sessão:
-
Livro do dia – Sortear uma pessoa que na sessão seguinte será
responsável por apresentar ao grupo, através de uma leitura em voz
alta, um livro de que gostou muito.
-
Autor desconhecido - Sortear uma pessoa que na sessão seguinte será
responsável por apresentar ao grupo, através de uma leitura em voz
alta, um livro de um autor que até essa data fosse para si
desconhecido.
-
Crónica humorística - Sortear uma pessoa que na sessão seguinte
será responsável por apresentar ao grupo, através de uma leitura
em voz alta, um texto humorístico.
-
Feira do livro – Cada participante traz um livro e coloca-o à
disposição do grupo
Mais
informações:
O
Clube de Leitura em voz alta de Alcochete tem um blogue que agora
partilha com o Coro de Leitores, que pode ser visto aqui:
O
Clube de Leitura em voz alta de Alcochete também já serviu de
estudo.
João
Duarte Victor, na sua pós graduação, escreveu “Formar o leitor
público: contributos do teatro para o desenvolvimento da leitura em
voz alta” que pode ser lido aqui:
Em
Fevereiro de 2017, o programa “Literatura aqui” dedicou algum
tempo ao Clube de Leitura em voz alta de Alcochete. Pode assistir
aqui ao programa, a reportagem sobre nós começa aos 13 minutos:
A
partir do Clube de Leitura em voz alta de Alcochete já se formaram
outros clubes de leitura em voz alta em escolas e em bibliotecas. Por
ser fácil de replicar, adaptando a cada circunstância e realidade,
criaram-se clubes destes nas bibliotecas municipais de Tábua e da
Sertã, numa escola de 1º ciclo em Alcochete e numa biblioteca
escolar de Mafra, da EB João Dias Agudo. Estes são aqueles que
conhecemos. Se o seu já está formado, partilhe connosco a sua
experiência.
Se
tiver alguma dúvida não hesite em contactar-nos através do e-mail
andante@andante.com.pt
Boas
leituras (em voz alta).
Fotos,
vídeos e edição de Fernando Ladeira
(excepto
um pequeno excerto do programa da RTP2 "Literatura aqui" e
um outro do programa da Antena 3 "Prova Oral")
Logótipo
do CLeVa de Américo Prata
O
Clube de Leitura em Voz Alta de Alcochete tem o apoio da Biblioteca e
do Município de Alcochete.
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